Ego é uma palavra latina que significa “eu”. O ego humano é
uma criação da mente, uma imagem mental que construímos sobre nós mesmos.
Estudos sobre a evolução do sistema cognitivo humano explicam como a criança
vai, aos poucos, criando uma identificação de seus pensamentos com sua
percepção inicial desse “eu”. Num passo seguinte, adquire o conceito de “meu” e
daí rapidamente aquilo que é “meu” passa também a fazer parte do “eu”. Essa
identificação do “eu” com objetos evolui para a identificação com outras
posses: pessoas (“minha” mulher, “meu” amigo) “minhas” ideias, “minhas” crenças.
Outros elementos são mais tarde incorporados pela mente ao conceito do “eu”:
nacionalidade, crenças, valores, religião, propriedades, partido político, etc.
A identificação dessa massa de pensamentos criada pela
mente, inclusive nossa história, nossas memórias, nossas “posses”, com a imagem
mental que criamos de nós mesmos chama-se egoísmo.Como essa imagem de nós mesmos é uma construção da mente, muitas tradições espirituais a descrevem como uma espécie de ilusão. Nas tradições espirituais do oriente, o estado de ser atrelado à crença ilusória de que nós somos o nosso ego é conhecido como Maya ou Samsara.
Na verdade, o ego é um falso “eu”.
Eckhart Tolle chega a dizer que, à medida que o ego se
desenvolve no indivíduo, este se torna, em certa medida, psicologicamente
insano, quando se leva em conta que o ego tende a produzir uma natureza mental
hiperativa e compulsivamente autocentrada.
Já falamos na corrente de pensamentos em posts anteriores. O
Ego é em geral associado com a ideia de tempo e com a mente, que pensa
compulsivamente para se assegurar de sua existência futura, em vez de
simplesmente ter a consciência de si mesma e do momento presente.
Essa “necessidade de fazer” de “estar ativo” para poder
existir, cria essa corrente ininterrupta e compulsiva de pensamentos que acaba
impedindo o indivíduo de ser consciente, de estar atento, de perceber sua
verdadeira natureza.
O que nos interessa aqui é que, nesse contexto, o egoísmo
bloqueia o desenvolvimento espiritual e a possibilidade de uma vida consciente.
E estamos, nesse blog, interessados em descobrir como se dá essa transformação
que nos leva a descobrir QUEM SOMOS NÓS e como podemos ter acesso ao nosso
verdadeiro EU.
Para isso, precisamos descobrir como é possível nos libertarmos
do pensamento compulsivo praticado pelo falso “eu” criado pela mente.
Precisamos entender que o pensamento sem consciência é a grande tragédia e
maior causa de infelicidade para a maioria das pessoas. E não há dúvidas de que
nossa identificação com o ego é inconsciente.Portanto, volto a enfatizar nosso entendimento de egoísmo: não estamos usando aqui os conceitos mais comumente encontrados, que na verdade são consequências ou manifestações do egoísmo: indiferença, arrogância, mesquinharia, dificuldade em compartilhar, etc.
A mente cria uma corrente, uma massa de pensamentos, que
inclui nossa história, nossas memorias, nossas “posses”, nossos desejos e
aversões, etc. O egoísmo é a identificação dessa massa de pensamentos com a
imagem mental que criamos de nós mesmos.
Vejam: não há nada de errado em possuir um ego. Precisamos
dele para viver em sociedade. Mas meu ego não é quem eu sou. O problema
acontece quando nos identificamos totalmente com ele – e o desafio é conseguir
evitar isso. Porque o ego opera de um modo que nos leva a comportamento
incompatível e oposto aos ensinamentos recomendados pelas grandes tradições
espirituais.
Vejamos algumas características do
ego:
- o ego quer sempre ser especial,
de preferência ser superior aos outros. Essa necessidade de ser especial também
leva, invariavelmente, as pessoas egocêntricas a precisarem constantemente ser
o centro das atenções. O ego quer ser o primeiro, quer aparecer, quer dominar.- se não puder ser especial, o ego se contenta em ser mais qualquer coisa. Até mais miserável ou mais sofredor! Tem uma conhecida historinha de uma comadre dizendo para a outra: “você não imagina a dor de cabeça que estou sentido desde hoje cedo!” A outra replica: “desde hoje cedo? Pois eu estou com uma terrível dor de cabeça há dias!” Disputa de egos...
- O ego quer ganhar, quer receber, em vez de dar. O ego tem o desejo de ter, de acumular, de se apegar, de possuir e nunca de ceder ou de abrir mão...
- o ego gera desejos: de avançar,
de conseguir mais, de possuir mais, de saber mais...
- o ego tem necessidade de estar
certo, de ter razão o tempo todo.- o ego precisa de conflito, e para eu poder estar certo, o outro precisa estar errado...
- o ego quer ser exclusivo. Os
publicitários há muito já entenderam isso e exploram fortemente essa aspiração
do ego: já reparou quanto eles usam o atributo exclusivo para vender produtos?
Nosso ego em geral nos leva a estar dispostos a pagar mais e mais pela
exclusividade!
- o ego enfatiza o tempo todo, a
diferença, a separação entre “eu” e o “outro”.
- à medida que o ego quer reter
tudo, pode fazê-lo mesmo à custa dos outros. O ego tende a se por sempre à
frente, a deixar os outros para trás.
- o ego adora as situações de
conflito, oposição e/ou confrontação com os outros. E todos os tipos de
conflito agradam o ego: entre nações, entre religiões, entre times de futebol,
partidos políticos, etc.- o ego tem necessidade de ter inimigos ou, pelo menos, adversários. O ego apoia-se no paradigma NÓS vs. ELES.
Como vimos no início, desde sua
formação o ego tende a se identificar com as formas criadas pelo pensamento.
Por isso o ego se sentirá ofendido se você criticar seu carro, sua casa, sua
roupa. Porque essas posses foram incorporadas ao ego, a esse falso “eu” criado
pela mente. O mesmo acontece se você criticar suas crenças ou suas opiniões: o
ego sente-se genuinamente agredido!
Depois desta descrição simplificada
das características do ego eu sugiro que você releia o post 004. Acho que fica claro com isso que a total
identificação com o ego, que ocorre com a maioria das pessoas, torna muito
difícil, senão impossível, que alguém possa seguir os ensinamentos de Jesus de
Nazaré, de Rumi, do Buda e de outros grandes mestres espirituais.
Repare que o ego se manifesta em
todas as esferas de nossa vida: profissional, afetiva, amorosa, espiritual. Os
efeitos do ego representam perigo inclusive no desenvolvimento espiritual.
Existem diversos relatos do que se pode chamar “espiritualidade egoísta”. Por
exemplo, o ego adora competir: “sou mais ‘espiritualizado’ do que ele”. O
desejo de possuir Deus, de desfrutar a presença de Deus, de ‘reter para mim’ o
prazer da interação com o divino são manifestações do ego. João da Cruz,
importante místico cristão, dizia que para evoluir espiritualmente é preciso se
livrar de tudo, até do desejo por Deus (mas não do amor de Deus).
O ego é um fator importante na
estruturação de nossa sociedade tecnológica e consumista. O lado tecnológico da
sociedade retrata a tendência do ego de “controlar tudo”. O lado consumista
retrata a tendência do ego de “desejar possuir mais”.
Entretanto, não tenho dúvidas de
que o Homem tem uma tendência, uma inclinação natural, que é mais forte do que
a tendência de se identificar com o ego. É uma inclinação profunda, atávica, de
evoluir na direção de Deus, de buscar uma conexão com o Criador. E esta é a
grande força que viabiliza a emergência do Eu verdadeiro. Essa é a força que
permite que alguns de nós consigamos superar a identificação com o ego,
consigam se livrar desse falso “eu” e ter acesso ao Eu superior, o Eu
verdadeiro. Assim é possível descobrir, finalmente, quem somos nós. No próximo
Post.
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