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quinta-feira, 19 de julho de 2012

Post 005 - Nosso Sistema Operacional


No Post anterior, investigávamos como é possível que nossa mente possa nos controlar. Vimos que a primeira razão disso é a corrente contínua de pensamentos, dominada pelo ego, que nos coloca quase o tempo todo num modo “automático”, semiconsciente, de agir.

O segundo motivo vem do “sistema operacional” sob o qual nossa mente funciona. Para entendermos melhor, vamos recorrer a uma metáfora computacional utilizada por Cynthia Bourgeault, no seu ótimo livro The Wisdom Jesus: nós, humanos, viemos ao mundo com um sistema operacional “básico” ativado, mas podemos fazer um ”upgrade”.

Esse sistema operacional nativo é essencialmente binário: ele funciona sob a lógica do “isso OU aquilo”, “certo / errado”, “bem / mal”.  Esse operador binário, estruturado num dualismo rígido, é o que rege nosso ego. Ele opera dividindo tudo que nossos sentidos percebem: dentro/fora; sujeito/objeto; bom para mim / ruim para mim. Dividir, rotular e separar conforme o rótulo é uma habilidade nativa, mas que também é fortemente reforçada pela educação que recebemos nas sociedades modernas. Um dos primeiros exercícios a que nossas crianças são submetidas quando entram na escola é mais ou menos assim: é-lhes apresentada uma coleção de objetos e pergunta-se: “qual desses objetos é diferente dos outros”? Se aprenderem a separar bem, são estimuladas.

Nosso pensamento é produto da mente, que é regida por esse sistema operacional binário.  Outra implicação disso no nosso pensamento é que ele evolui da separação para a fragmentação. Passa então a dividir as coisas em partes que não precisariam ser divididas. Dividimo-nos em nações, em partidos políticos, em times de futebol, em grupos religiosos. E então somos “nós” x “eles”.  “Nós” estamos dentro, “eles” estão fora.  Inicialmente, “eles” são apenas o outro grupo, do qual nos excluímos e nos apartamos, mas facilmente essa separação nos leva a considera-los como adversários e, mais um pouquinho, como inimigos. Guerras santas por causa de diferenças religiosas custaram milhões de vidas e muita violência à humanidade, e isso continua até hoje. Tudo produto do pensamento.

Recentemente, fiquei impressionado com resultados de brigas entre torcidas de times de futebol, no Rio e em São Paulo. Pessoas são assassinadas ou mutiladas com pauladas por causa desse tipo de rivalidade! De onde vem isso? Tem algum fundamento aparente?

Certamente, a explicação é muito mais complexa que a violência do assaltante que tem como objetivo um ganho material imediato. Vamos analisar isso mais adiante.

Nosso pensamento fragmenta tudo. Na ciência, cada especialidade, por mais definida que seja, é dividida em outras. E chega um a um ponto em que um especialista de um desses nichos não sabe nada e não entende nada do que ocorre em outro nicho da mesma especialidade. Um médico otorrinolaringologista não faz a menor ideia sobre os procedimentos cirúrgicos de um médico gastroenterologista. Na informática, um especialista em redes não sabe nem começar a fazer um “tunning” do banco de dados. E por aí vai.

Todas as divisões são criadas pelo nosso pensamento e, no entanto, ele nos convence de que elas são naturais.  A divisão em nações não é natural: é produto da mente humana, mas, no dia a dia, agimos como se o mundo tivesse sido criado assim. E quantos milhões de criaturas morreram, sofreram barbaramente com horrores da guerra, por causa da noção de nacionalismo?  Idem para as religiões, partidos políticos, etc.

Todo o resto da percepção fragmentada do que temos do mundo e de nós mesmos é criação da mente. A nossa própria identidade é percebida assim.

Quando eu penso em quem eu sou, faço isso através de uma série de atributos (rótulos): Sou engenheiro, nasci no Rio, gosto das montanhas, sou sagitariano, etc. Essa lista de atributos é que me torna diferente, especial, único.  Claro, essa mesma lista de rótulos eu atribuo aos outros e é ela que os torna diferentes de mim, separados de mim.  Esse senso de identidade baseado no ego, criado pelo pensamento é um muito comum e predominante nos seres humanos, mas as grandes tradições espirituais não endossam isso.

 Na verdade, esse ego, separado de tudo mais, é uma ilusão, uma miragem, uma criação da mente. É consequência desse sistema operacional que rotula tudo, separa tudo, fragmenta toda a realidade, para poder compreendê-la.  Jesus, como outros grandes mestres espirituais, vem nos convidar a nos libertarmos dessa ilusão.

Cynthia Bourgeault faz um resumo encantador sobre isso. Segundo ela, os ensinamentos de Jesus sobre essa transformação são tão vívidos que é como se ele estivesse nos dizendo:

Ei, você pode fazer um upgrade no seu sistema operacional – e a vida vai lhe parecer bem mais interessante quando você fizer”.

Você não vai achar isso na bíblia dessa forma, mas para mim também parece um ótimo resumo de sua mensagem. Mais adiante, vamos ver quais passagens do evangelho são resumidas por isso. Mas antes, precisamos entender um pouco mais o que é o ego e como ele atua em nós. No próximo Post !